sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Arpinsul divulga manifesto em apoio à candidatura de Dilma Roussef

A Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ARPINSUL) divulgou, no início desta semana, um manifesto em apoio à candidatura de Dilma Roussef à Presidência da República.

O documento afirma que "o 2º turno das eleições cristalizou ainda mais a polarização entre dois projetos distintos para o Brasil. Está em disputa qual Brasil queremos construir. Um que avance nas transformações sociais, no sentido de dar continuidade às políticas de distribuição de renda, pautado por um claro projeto nacional de crescimento, redução das desigualdades e aprofundamento da democracia. Um Brasil que preserve sua dignidade reconquistada nos últimos oito anos. Ou um país que vai retomar o rumo das políticas privatistas que marcaram a década de 90, em que os projetos aplicados no Brasil estavam subordinados a um pensamento dominante internacional, que colocava nações como a brasileira em condição de dependência, em que não havia ênfase em programas sociais de cunho estruturante e voltados para a inclusão social; que priorizava somente o capital a qualquer custo em detrimento das tradições dos nossos povos e da conservação do seu habitat natural."

E acrescenta "Ao longo dos oito anos de governo do Presidente LULA, a ARPINSUL sempre honrou suas posições de intransigente defensora dos direitos dos Povos Indígenas. Nesse sentido houve diferenças, como as questões da Hidroelétrica de Belo Monte, a transposição do Rio São Francisco e a reestruturação da FUNAI: diferenças de idéias, de proposituras e de prioridades de estado. Assim foi, pois a unanimidade é o caminho mais curto para a estagnação. No entanto, mesmo nas diferenças que encontramos neste governo, acreditamos que é pelo diálogo, pelo qual alcançamos relevantes avanços, como recentemente a criação da Secretaria Especial de Saúde Indígena, a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol e a inclusão dos povos indígenas nos programas e projetos do Ministério da Cultura, pela qual tanto lutamos, deveremos prosseguir."

Leia a íntegra do manifesto no site da Arpinsul clicando aqui.

CARTA PÚBLICA AOS PRESIDENCIÁVEIS

OS DIREITOS INDÍGENAS NO NOVO GOVERNO

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), instância nacional que congrega organizações indígenas regionais - Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB); Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME); Articulação dos Povos Indígenas do Sul (ARPINSUL); Articulação dos Povos Indígenas do Pantanal (ARPIPAN); Grande Assembléia do Povo Guarani (Aty Guasu) e Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (ARPINSUDESTE), face ao momento político-eleitoral em que os candidatos à Presidência da República apresentam propostas que afetarão o futuro do Brasil e o destino de todos os brasileiros e brasileiras, sendo os povos indígenas também cidadãos desta nação, vem por meio da presente carta pública reafirmar o direito de reivindicar do Estado Brasileiro o atendimento às demandas que historicamente tem pautado a luta dos nossos povos, na defesa de suas terras, identidade e culturas.

Depois de mais de 20 anos em que a Constituição Federal reconheceu o caráter multiétnico e pluricultural do país, portanto, o nosso direito à diferença e todos os direitos nela consagrados, lamentavelmente os nossos povos continuam sendo vítimas de um contexto político adverso, marcado pelo preconceito, a discriminação e o racismo de uma sociedade etnocêntrica, pretensamente monocultural, homogeneizante, e de um Estado preso à “razão” instrumental do mito do “mercado” e de um tipo de desenvolvimento e extrativismo marcado pelo sonho do crescimento ilimitado baseado na destruição da Mãe Natureza.

A partir desta matriz neocolonial, setores ou representantes do latifúndio, do agronegócio, das mineradoras, das madeireiras, dos grandes empreendimentos ou dos próprios governos têm se articulado para reverter os direitos constitucionais dos povos indígenas e tomar por assalto as terras indígenas e os recursos naturais, hídricos, da biodiversidade e outras potencialidades, incluindo uma das maiores diversidades étnicas do planeta, que há milhares de anos preservamos.

Os nossos povos continuam ainda sendo tachados não só de entraves ao chamado desenvolvimento e progresso do país, mas como ameaça à integridade e unidade política e territorial do Estado brasileiro. Nos acusam de estarmos empreendendo processos separatistas ou independentistas que atentam contra a soberania nacional. A autonomia dos povos, porém, reconhecida pela Constituição Federal e pela Declaração das Nações Unidas, não se confunde nem deve ser confundida com intenções separatistas. Nós, os indígenas, somos cidadãos brasileiros, sim, mas não por isso devemos renunciar à nossa identidade específica e diferenciada, aos nossos direitos fundamentais e originários.

Contudo, os nossos povos têm se organizado e lutado contra essa violência explícita ou simbólica, que tem em muitos casos adquirido caráter institucional, mesmo a custa da criminalização, das perseguições, ameaças de morte, prisões arbitrárias e assassinatos de valentes guerreiros. Herdeiros dessa trajetória de luta é que viemos mais uma vez tornar pública e exigir de quem for governar o Brasil nos próximos 4 anos o atendimento das seguintes demandas:

1- Aprovação do Novo Estatuto dos Povos Indígenas, engavetado há mais de 15 anos no Congresso Nacional, lei infraconstitucional que deverá nortear todas as políticas e ações da política indigenista do Estado.

2 – Aprovação do Projeto de Lei e efetivação do Conselho Nacional de Política Indigenista, instância deliberativa, normativa e articuladora de todas essas políticas e ações, atualmente dispersas nos distintos órgãos de Governo.

3 – Implementação da Secretaria Especial de Saúde Indígena e efetivação da autonomia política, financeira e administrativa dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI`s), com a participação plena e controle social efetivo dos nossos povos e organizações nos distintos âmbitos, local, e nacional, a fim de evitar a reprodução de práticas de corrupção, apadrinhamentos políticos, precariedade ou ausência de atendimento humanizado nas nossas comunidades.

Que o novo subsistema garanta também o respeito e valorização dos conhecimentos e da medicina tradicional (Pajés, parteiras, plantas medicinais) dos nossos povos e o reconhecimento da categoria profissional e remuneração justa dos Agentes Indígenas de Saúde (AIS) e Agentes Indígenas de Saneamento (AISAN).

4. Demarcação, proteção e desintrusão de todas terras indígenas, priorizando com urgência o caso crítico dos povos indígenas de Mato Grosso do Sul, principalmente os Guarani Kaiowá, submetidos a um processo vil de etnocídio e extermínio a mando de fazendeiros e representantes do agronegócio.

5. Não construção de empreendimentos que impactam direta ou indiretamente as terras indígenas, tais como: a Transposição do Rio São Francisco, o Complexo Hidrelétrico de Belo Monte e as Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH`s) no Xingu e na região sul do país, bem como rodovias, ferrovias, portos, hidrovias, torres e linhas de transmissão e outros empreendimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC II) para evitar estragos irreparáveis à mãe natureza, mas, sobretudo, à sobrevivência física, cultural e espiritual dos povos que nelas habitam, assegurando ainda o nosso direito à consulta livre, prévia e informada, estabelecida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

No entanto, reivindicamos a normatização das políticas de compensação previstas em casos de empreendimentos já instalados, garantida também a aplicabilidade deste instrumento e da Constituição Federal e outros normas que protegem os direitos indígenas.

6. Fim da criminalização e prisão arbitrária de lideranças indígenas que lutam especialmente pelos direitos territoriais de seus povos e comunidades, influenciando o poder judiciário e polícia federal para que respeitem as nossas lideranças enquanto lutadores por seus direitos e não os trate como quaisquer criminosos, agilizando, em contrário a punição dos mandantes e executores de crimes cometidos contra os povos e comunidades indígenas.

7. Criação e implementação da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas para que todo o investimento financeiro, material e humano e os resultados obtidos do processo de Consultas aos povos indígenas não sejam em vão.

8. Adequação da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) a um novo patamar da política indigenista, que não seja paternalista, assistencialista, tutelar e autoritário, em respeito ao reconhecimento da autonomia dos povos indígenas e conforme suas reais necessidades e aspirações.

9. Garantia de acesso de todos os indígenas à educação de qualidade, de forma continuada e permanente, nas aldeias, na terra indígena ou próxima da mesma, conforme a necessidade de cada povo, com condições apropriadas de infra-estrutura, recursos humanos, equipamentos e materiais, respeitando o projeto político-pedagógico próprio, calendário e currículo diferenciado, conforme a tradição e cultura dos nossos povos e de acordo com a resolução 03 do Conselho Nacional de Educação (CNE).

Exigimos ainda que o MEC crie junto aos Estados escolas técnicas profissionalizantes, amplie o ensino médio e programas específicos de graduação para os povos indígenas, assegurando ainda o ensino científico integrado com os conhecimentos tradicionais para os estudantes indígenas, a realização de concurso público específico e diferenciado para os professores indígenas, a valorização, reconhecimento e remuneração justa da categoria de professores indígenas, o reconhecimento dos títulos dos estudantes indígenas formados no exterior, a participação dos povos e organizações indígenas na implementação dos territórios etnoeducacionais e a criação de uma Secretaria Especial de Educação Escolar Indígena no âmbito do MEC.

10. Participação dos povos indígenas na discussão e estabelecimento de quaisquer medidas ou políticas públicas que os afete, tais como as discussões relacionadas com iniciativas o planos de enfrentamento da mudança climática, atualmente empreendidas por setores do governo brasileiro e organizações não governamentais, sem o envolvimento dos primeiros interessados, nós os povos indígenas, que milenarmente temos contribuído na manutenção das florestas em pé e na implementação de mecanismos de redução da emissão de gases de efeito estufa e outros serviços ambientais que até o momento não são reconhecidos e valorizados.

Salientamos que neste tema o quadro de crise é preocupante, tratando-se de uma catástrofe marcada pelas inundações, secas, processos de desertificação, degelos, desaparecimento de espécies e ecossistemas, chuva ácida, poluição urbana, águas contaminadas, transgênicos de conseqüências imprevisíveis, uma infinidade de atentados contra a vida do planeta e da humanidade.

Diante desse quadro, somos contra qualquer proposta de desenvolvimento que mesmo se dizendo sustentável não contraria a lógica marcantilista, desenvolvimentista a qualquer custo e consumo exarcerbado, dominado pela privatização d`água, das florestas, da atmosfera, enfim, da vida, rompendo a harmonia e a unidade entre vida-sociedade e cultura que milenarmente praticamos.

Esperamos que o próximo governo coloque de fato a questão indígena na centralidade das políticas do Estado, garantindo os nossos direitos de cidadãos brasileiros, mas também de povos com direitos coletivos diferenciados, com quem esse Estado tem ainda enormes dívidas históricas e sociais por pagar.

Brasília, 20 de outubro de 2010.


Articulação dos Povos Indígenas do Brasil-APIB

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Nota Pública sobre o assassinato do indigena Pataxó Hã Hã Hãe José de Jesus Silva

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e as organizações regionais que dela fazem parte – Apoinme, Arpinsul, Arpipan, Arpinsudeste, Aty Guasu e Coiab – manifestam publicamente profunda revolta e indignação diante do assassinato covarde da liderança indígena Pataxó Hã Hã Hãe, José de Jesus Silva, 37 anos, também conhecido como Zé da Gata, que morava na Aldeia Caramuru Paraguaçu, no município de Pau Brasil, na Bahia.

O crime ocorreu no último dia 23 de outubro, na estrada que liga Pau Brasil a Itaju do Colônia. José de Jesus foi atingido por um tiro de rifle, disparado por indivíduos em uma moto. O indígena levava mantimentos para os companheiros que participam da retomada de área da fazenda Boa Vista, que na verdade é terra tradicional Pataxó Hã Hã Hãe.

Os Pataxó Hã Hã Hãe aguardam há mais de 28 anos decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre Ação de Nulidade de Títulos sob a Terra Indígena Caramuru Catarina Paragusssu. Indignados com a demora da Justiça em resolver a questão, as lideranças da região promoveram, no último dia 4 de outubro, a retomada de áreas em seis fazendas nos municípios de Pau Brasil e Itajú do Colônia. Como represália por parte dos fazendeiros invasores de terras, os índios foram atacados por pistoleiros fortemente armados no dia 10 de outubro. O ataque foi denunciado às autoridades responsáveis, mas nada foi feito. Agora, diante da omissão do Estado, mais um capítulo desta história foi manchado com sangue indígena.

Diante de mais este crime absurdo contra uma de nossas lideranças, a APIB exige:

- Apuração imediata e punição exemplar, por parte das autoridades federais e estaduais, dos responsáveis (mandantes e executores) pelo assassinato do líder indígena José de Jesus Silva.

- A realização, o mais rápido possível, por parte do STF, do julgamento da Ação de Nulidade de Títulos sob a Terra Indígena Caramuru Catarina Paragusssu, pondo um fim definitivo ao sofrimento das famílias Pataxó Hã Hã Hãe que já dura mais de 28 anos.

- Também cobramos agilidade da Fundação Nacional do Índio (Funai) no levantamento e pagamento de indenização das benfeitorias feitas por ocupantes de boa fé, de modo a acelerar a desintrusão das Terras Indígenas na região.

A APIB se solidariza com o Povo Pataxó Hã Hã Hã em sua dor e garante que permanecerá vigilante para que a Justiça seja feita.

Brasília, 26 de outubro de 2010


Articulação dos Povos Indígenas do Brasil - APIB

Movimento Indígena encaminha reivindicações e propostas aos presidenciáveis

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) encaminhou aos candidatos à presidência da república Carta Pública, onde constam as principais demandas e propostas do Movimento Indígena para uma nova política indigenista para o Estado Brasileiro no próximo governo. O documento foi redigido com base nas resoluções contidas no Documento Final do Acampamento Terra Livre (ATL) 2010, maior assembléia e mobilização indígena nacional, que este ano reuniu mais de 800 lideranças em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, onde durante três dias foram discutidos os principais temas relacionados a questão indígena, com destaque para demarcação de terras, criminalização de lideranças e a situação grave de perseguição vivida pelo Povo Guarani Kaiowá, em MS, e também pelos indígenas do Sul da Bahia.

Durante o evento, um dos principais encaminhamentos foi o de que a Comissão Nacional Permanente da APIB, em Brasília, iria levar as deliberações do plenário do ATL e os pleitos históricos do Movimento Indígena, ainda não atendidos, aos candidatos à Presidência da República, tarefa esta que foi cumprida nas últimas semanas.

Foto: Marcos Apurinã, coordenador da Coiab, entrega Carta Pública da APIB à Dilma Roussef

A Carta Pública aos Presidenciáveis foi entregue, em mãos, à candidata Dilma Roussef durante evento do Partido Verde em apoio ao Partido dos Trabalhadores, realizado no Hotel Nacional, em Brasília, no último dia 20 de outubro. Já devido a problemas de agenda, não houve possibilidade de um encontro pessoal entre o candidato José Serra e os representantes indígenas, no entanto, o documento foi enviado à assessoria do tucano. Vale ressaltar que o Documento Final do ATL 2010, e a própria carta, também foram encaminhado às principais autoridades dos Três Poderes, ministros, parlamentares, juízes, demais candidatos à presidência e também ao Presidente Lula.

Leia a íntegra da Carta Pública da APIB aos Presidenciáveis, clique aqui.

Fim da prisão preventiva de Joel Braz

O índio Joel Braz, liderança do povo Pataxó do extremo Sul da Bahia, passará a responder em liberdade os processos que correm contra ele na Justiça Federal de Eunápolis (BA). Vítima de um dos mais cruéis processos de criminalização de lideranças indígenas, Joel vinha sendo custodiado no posto avançado da Funai da Aldeia de Barra Velha, por força de prisão preventiva decretada pelo Juiz Federal Marcio Flavio Mafra Leal, a pedido do Ministério Publico Federal.

O assessor jurídico do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Luciano Porto, havia formulado o pedido de revogação da preventiva, em face do exaurimento da finalidade da medida cautelar, uma vez que Joel tem se apresentando, regularmente, em juízo, bem como sido intimado de todos os atos processuais, razões mais que suficientes para se afastar o absurdo argumento de que ele estava foragido.

Joel poderá agora deixar o seu confinamento, o seu isolamento e, de certo modo, o abandono ao qual vinha sendo submetido.

Fonte: Cimi

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Presidente Lula assina decretos que viabilizam a Secretaria Especial de Saúde Indígena


No útimo dia 19 de outubro, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou os decretos presidenciais que permitem a criação da Secretária Especial de Saúde indígena (SESAI). Os decretos nº 7335 e 7336 modificam, respectivamente, as estruturas Fundação Nacional de Saúde (Funasa), antiga responsável pela saúde indígena e pelo saneamento básico nas aldeias, e do Ministério da Saúde. O primeiro documento (leia aqui) redefine as atribuições e a organização da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), enquanto o segundo (leia aqui) oficializa a criação da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), dentro da estrutura do Ministério da Saúde, garantindo os cargos e insumos necessários ao funcionamento da secretaria.

A SESAI será dividida em três áreas: Departamento de Gestão da Saúde Indígena, Departamento de Atenção à Saúde Indígena e Distritos Sanitários Especiais Indígenas. O órgão também será responsável pelas ações de saneamento básico e ambiental das áreas indígenas. Também foi garantida a autonomia dos 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI), existentes em todo país, e que passarão a funcionar como unidades gestoras descentralizadas, responsáveis pelo atendimento e pelo saneamento básico em cada região. A autonomia dos distritos desburocratiza a atenção à saúde indígena, que passa a estar integrada e articulada com todo o Sistema Único de Saúde (SUS).

O Ministério da Saúde terá, ainda, um prazo de 180 dias, a partir da publicação dos decretos, para que seja finalizada a transição da saúde indígena para a SESAI. Durante a cerimônia de assinatura, o ministro José Gomes Temporão a proveitoua oportunidade para confirmar o nome do atual Secretário de Gestão Estratégica e Participativa (SGEP) do Ministério da Saúde, Antonio Alves, para a direção da Secretaria de Saúde Indígena. Alves afirmou, anteriormente, em reunião com representantes da APIB, que durante a transição não haverá interrupção no atendimento às populações indígenas. Neste período será criado um comitê de resposta rápida ligado a cada Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei), que ficará responsável pela resolução dos problemas emergenciais de cada região e pela garantia de assistência médica.

Foto: Edmilson Terena pediu também atenção para a Demarcação de terras Indígenas

O coordenador do Fórum de Presidentes do Conselho de Saúde Indígena (Condisi), Edmilson Terena, lembrou que a luta pela secretaria que culminou neste momento histórico teve início na 1ª Conferência de Saúde indígena no ano de 1993. Ele afirmou, ainda, que além das ações na área da saúde o governo precisa assegurar a demarcação das Terras Indígenas, pois “nenhum povo pode ter saúde sem ter onde morar e preservar sua cultura”.

Já o ministro José Gomes Temporão acredita que a nova secretaria marca um avanço sem precedentes para saúde indígena. "A assinatura do decreto inaugura uma nova fase, em que teremos condições de aprimorar a política de saúde indígena, de maneira integrada, desde a atenção básica até a internação. E o que é fundamental, todo esse processo vem se dando com o apoio e participação das lideranças que militam na área".

Foto: Ministro José Gomes Temporão discursa sobre importância da SESAI

O Projeto de Lei de Conversão (PLV) 08/2010, originado da Medida Provisória 483/2010, aprovado pelo Congresso Nacional no último dia 3 de agosto e que autorizou a criação da SESAI, também alterou a Lei nº 8745, que regulamenta o regime jurídico, permitindo, ainda, a contratação de pessoal, sem concurso público, por um período determinado, entre 2 e 4 anos. Desta forma será possível contratar profissionais que já tenham experiência com saúde indígena, bem como oferecer remuneração diferenciada compatível com as realidades locais, o que aumenta a qualidade do trabalho.

Funcionamento do sistema de saúde para os indígenas

Cerca de 751 postos de saúde das comunidades indígenas de todo o país são as bases da atuação das equipes multidisciplinares de saúde indígena, compostas por médico, enfermeiro, odontólogo e auxiliares, além dos Agentes Indígenas de Saúde (AIS) e dos Agentes Indígenas de Saneamento (AISAN). Os agentes moram nas aldeias e são indicados pelos Conselhos Locais de Saúde Indígena. A eles competem ações de atenção primária, saneamento e educação ambiental. Os casos que não podem ser resolvidos nos 358 pólos-base são encaminhados pelas equipes multidisciplinares aos 62 municípios de referência, que contam com as Casas de Saúde do Índio (Casai), responsáveis pelo atendimento de Média e Alta Complexidade (realização de exames, consultas, internações).























































segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Evento vai discutir Regime Nacional de REDD+ e Fundo Amazônia

Entre os dias 19 e 21 de outubro (terça e quinta), a partir das 8h, acontecem no Centro de Convenções Israel Pinheiro, em Brasília (DF), a Consulta sobre o Regime Nacional de REDD+ e uma Reunião de Trabalho sobre o Fundo Amazônia. O evento conjunto vai reunir lideranças indígenas e de comunidades tradicionais, organizações não governamentais e movimentos sociais.

No primeiro dia, serão discutidas iniciativas em curso de redução de emissões por desmatamento e degradação florestal; conservação; manejo sustentável das florestas; e aumento de estoques florestais (REDD+). O segundo e terceiro dias terão como foco as dificuldades na implementação do Fundo Amazônia e a proposição de medidas de adequação para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), responsável pela gestão do fundo.

A manhã de quarta-feira (dia 20) será aberta apenas à participação de representantes da sociedade civil e movimentos sociais. O Fundo Amazônia foi criado em 2008 a partir da sugestão do governo federal de criar um instrumento de captação de doações voluntárias para investir em projetos de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento; conservação e uso sustentável da floresta.

No encerramento, os documentos elaborados durante a consulta e a reunião serão apresentados ao público e encaminhados ao BNDES e ao Ministério do Meio Ambiente (MMA), que está conduzindo encontros com representantes da sociedade civil e governos para discutir uma proposta de regime nacional de REDD+. “É importante ter a participação dos movimentos sociais nas discussões sobre REDD+ e Fundo Amazônia. Esse evento irá fortalecer o debate e a troca de experiências entre os povos da floresta”, comenta Rubens Gomes, presidente do Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), um dos organizadores do encontro.

O evento conjunto é promovido pelo GTA, o Instituto Socioambiental (ISA) e o WWF com apoio do Conselho Nacional de Populações Extrativistas (CNS), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Rede Povos da Floresta, Grupo de Trabalho de Manejo Florestal Comunitário e Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). Também participarão como observadores representantes do BNDES, Banco Mundial, Bank Information Center (BIC) e da Agência de Cooperação da Alemanha (GTZ).
Fonte: Coiab

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Decreto Presidencial que possibilita o início da implantação da Secretaria Especial de Saúde Indígena sai na próxima semana

Foto: Secretário Antonio Alves (de terno) conversa com a CNP/PIB

A afirmação foi do representante do Ministério da Saúde, Antonio Alves, durante reunião na sede da APIB

No próximo dia 19 de outubro, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) começa a sair do papel com a assinatura do Decreto Presidencial que modifica as estruturas do Ministério da Saúde e da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), antiga responsável pela saúde indígena, e permite o funcionamento efetivo do novo órgão. Quem garante é o Secretário de Gestão Estratégica e Participativa (SGEP) do Ministério da Saúde, Antonio Alves, nome indicado para assumir a direção da nova secretaria, que se reuniu com os integrantes da Comissão Nacional Permanente (CNP) da APIB em Brasília.

O secretário explicou que a aprovação no último dia 3 de agosto do Projeto de Lei de Conversão (PLV) 08/2010, originado da Medida Provisória 483/2010, autorizou a criação (estrutura e cargos) e a transferência da saúde indígena para a SESAI, vinculada diretamente ao Ministério da Saúde, com recursos próprios garantidos no orçamento da União. No entanto, para que a secretária pudesse começar a funcionar ainda faltava reajustar os órgãos de governo e o subsistema de saúde à nova realidade, o que ficará a cargo do Decreto, que está semana obteve parecer favorável das consultorias jurídicas dos Ministérios do Planejamento e da Saúde, já foi enviado a Casa Civil e agora aguarda apenas a assinatura do Presidente da República, em cerimônia prevista para acontecer no Palácio do Planalto, com a presença de lideranças indígenas.

A maior preocupação exposta pelos representantes da APIB no encontro diz respeito à manutenção do atendimento nas aldeias durante o processo de implantação definitiva da SESAI, uma vez que diariamente chegam reclamações de todas as partes do país sobre falta de profissionais de saúde, medicamentos e equipamentos. Uma conseqüência direta da omissão e do descaso da Funasa nos últimos anos, que se intensificou desde o anúncio de criação da secretária, gerando um verdadeiro caos para aqueles que necessitam de assistência médica.

Antonio Alves informou que um artigo do Decreto Presidencial estipula um prazo de 180 dias, a partir da publicação, para que seja finalizada a transição da saúde indígena para a SESAI. Ele assegurou que não haverá interrupção no atendimento neste período e que, após a publicação do decreto, será criado um comitê de resposta rápida ligado a cada Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) existente, que ficará responsável pela resolução dos problemas emergenciais de cada região e pela garantia de assistência médica. A Funasa não é mais intermediária junto ao governo e agora as equipes multifuncionais subordinadas aos Dseis irão tratar com a secretaria, que por sua vez se comunicará diretamente com o Ministro da Saúde.

Os Dseis são as unidades responsáveis pelo conjunto de atividades técnicas de atenção à saúde, que promovem a reordenação da rede de saúde e das práticas sanitárias e organizam as atividades administrativo/gerenciais e estimulam o controle social.

Além da autorização para a criação da SESAI, o PLV aprovado pelo Congresso Nacional alterou a Lei 8745, que regulamenta o regime jurídico, permitindo, ainda, a contratação de pessoal, sem concurso público, por um período determinado, entre 2 e 4 anos. Desta forma será possível contratar profissionais que já tenham experiência com saúde indígena, bem como oferecer remuneração diferenciada compatível com as realidades locais, o que aumenta a qualidade do trabalho.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

ARPIN-SUL responde declarações do Ministro da Justiça sobre Povos Indígenas

No último dia 03 de outubro, o Ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, concedeu entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo (clique aqui para ler), onde pela primeira vez desde que assumiu sua pasta, se pronunciou publicamente sobre a questão indígena. A entrevista desagradou a Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ARPIN-SUL), que divulgou, esta semana, um texto onde responde às declarações do ministro.

Leia abaixo a íntegra do texto:

RESPOSTA À ENTREVISTA DO MINISTRO DA JUSTIÇA

Por: Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (ARPIN-SUL)

Uma Declaração cômoda e perigosa por parte do Ministro da Justiça quando afirma que 95% das terras indígenas estão demarcadas, como se os Povos Indígenas e suas comunidades não aumentassem a sua população, como se a população de 500 anos atrás fosse a mesma em 2010. Esquece o Ministro que o fato de estarem demarcadas, não significa que os índios têm acesso e usufruto destas terras porque mais da metade delas continua invadida e ocupada, seja de má ou boa fé, como acontece com as terras da região sul, onde muitas estão demarcadas, mas as famílias de colonos continuam vivendo e usufruindo as mesmas porque nunca foram indenizadas.

O compromisso do Estado Brasileiro em reservar terras para as comunidades indígenas não pode por fim ao processo demarcatório a que se refere o Ministro, sob pena de se agravarem ainda mais os conflitos pelas retomadas de terras, o Estado tem sim que garantir e reservar terras para a ampliação das reservas indígenas é impossível impedir o crescimento da população indígena porque o Estado diz que já não demarcará mais terras, submetendo nossos Povos a um verdadeiro “aparteid” em pleno século XXI, ao contrário do que afirma o Ministro, o Brasil está longe de pagar a dívida histórica com os Povos Indígenas, até porque ela não foi estipulada na devolução de 12% do território nacional, é muito mais que isso!

Nós também somos contra o paternalismo que deixou suas mazelas e uma dependência criminosa em nossas comunidades, mas mais criminoso ainda é simular uma “autonomia”, sem que tivéssemos sido preparados para isso, é muito cômodo da noite para o dia o Estado Brasileiro declarar que somos autônomos através de um Decreto (7.056/2009),como aconteceu com os escravos vocês são livres se virem porque autonomia não se decreta, autonomia é um processo de preparação, de construção e de conquista, autonomia se exerce não se mendiga! O que o Estado está fazendo com nossas comunidades é irresponsável, quando declara que são autônomos, mas na hora de receber as compensações pelos prejuízos causados pelo PAC, como ocorrido com Sto. Antonio Jirau em que a FUNAI recebeu R$ 6.000.000,00 (seis milhões de reais), para projetos com as comunidades indígenas, perguntamos: Porque os índios não receberam esse recurso através de suas organizações? É uma grande oportunidade de demonstrarem sua autonomia... Mas nessa hora são tutelados porque quem recebe os recursos é o governo através da FUNAI, essa autonomia que querem nos dar é de acordo com as conveniências, ou seja, quando convém somos autônomos, mas quando não convém, somos incapazes...

Se os Estado nos considera parte ativa do Brasil, porque não somos respeitados no nosso direito a consulta, conforme prevê a Convenção 169/OIT, quando se trata de colocar empreendimentos dentro das nossas terras, porque somos incapazes ou tutelados? O direito a consulta é um processo democrático onde os Povos Indígenas participam ativamente das negociações e decisões, mas isso sempre nos foi negado. Nós, Povos Indígenas do Brasil, sabemos da necessidade de se combater a extrema pobreza que afeta País onde vivemos através de projetos de desenvolvimento, mas também sabemos e afirmamos que isso não deve ocorrer à custa e em detrimento dos direitos humanos e fundamentais dos Povos Indígenas, sabemos também e queremos que o desenvolvimento que se leva a cabo em nosso país em nome da segurança energética e outras questões consideradas de relevante interesse público deve contemplar reconhecer e respeitar as diferenças e especificidades dos nossos Povos, porque se assim não o for, como não o tem sido, a pobreza que nos afeta é ainda maior, porque é uma pobreza que nos marginaliza que nos discrimina e que nos exclui dos processos de desenvolvimento interno.

Sabemos também que um dos pontos de maior resistência do governo em relação à implementação dos direitos indígenas é questão da consulta e do consentimento prévio, livre e informado, na implantação de mega-projetos que afetam nossas culturas e formas de vida, mas queremos que o Estado brasileiro veja o direito ao consentimento prévio, livre e informado não apenas como uma consulta para ouvir um “sim” ou um “não” em relação a determinado empreendimento, mas como uma oportunidade de estabelecer um diálogo definitivo entre Povos Indígenas e as instituições nacionais, em condições de equidade e igualdade, onde as partes coloquem sobre a mesa suas reais preocupações num diálogo franco e transparente, onde o respeito e a democracia sejam os condutores das decisões que favoreçam ambas as partes.

Ao invés de editar Decretos, Estatutos, Leis que se quer nos ouviram para serem redigidos, porque o Estado não apresenta propostas concretas de desenvolvimento das comunidades indígenas, onde estão essas propostas de que tanto se fala e que nunca são postas em prática?

Finalmente, queremos dizer que é no mínimo discriminatória a forma como o Ministro se dirige aos índios que ocupam ou ocuparam função (DAS) dentro da FUNAI, não vemos porque o índio não pode ocupar uma função dentro do órgão indigenista, se os brancos que são postos lá por indicações políticas muitas vezes são analfabetos e incapazes de executar as ações que o cargo exige.

Mais uma vez a ARPIN-SUL, será implacável na defesa dos direitos indígenas, e não hesitaremos em responder e denunciar nas instâncias internacionais a violação cotidiana dos nossos direitos por parte do estado brasileiro.

Curitiba, 06 de outubro de 2010

Romancil Kretã
Coordenador
Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Ministro da Justiça fala sobre demarcações e autonomia dos Povos Indígenas

No dia 3 deste mês, o Ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, concedeu entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, onde revelou o que pensa sobre demarcações de terras e o futuro dos Povos Indígenas em nosso país. Acompanhe a entrevista, reproduzida abaixo:

"É hora de pôr fim à era do paternalismo e da tutela"

Ministro da Justiça diz que a Funai não pode mais ser um órgão de Estado incumbido de fazer uma ´proteção ideológica com os olhos fechados´ nas reservas indígenas do País

Vannildo Mendes e Rui Nogueira / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo

O Brasil já demarcou 95% das terras indígenas previstas na Constituição, conforme levantamento do Ministério da Justiça. Restam só 5% de áreas pendentes para o País saldar uma dívida de cinco séculos com os povos tradicionais. Diante desse saldo, o ministro Luiz Paulo Barreto não tem dúvida de que chegou a hora de ´´pôr fim à era do paternalismo e da tutela´´. Para o ministro da Justiça, congelar o desenvolvimento e manter a tutela como ´´uma proteção ideológica com olhos fechados´´ é não entender que ´´os índios são parte ativa doBrasil moderno, e não do Brasil antigo´´.

Em entrevista ao Estado, o ministro diz que a manutenção das reservas como espaços economicamente intocáveis ´´gera dependência, corrupção e exploração predatória´´. A avaliação é que os próprios índios ´´não aceitam mais viver como se estivessem num jardim zoológico, observados por brancos´´.


O que o governo quer mudar com a nova política indigenista?

Há sinais claros de que está chegando ao fim a era do paternalismo e da tutela. Essa política se baseou na demarcação de terras. Havia uma preocupação correta com a necessidade de demarcar as terras previstas na Constituição, investiu-se muito nisso e até se estabeleceu uma guerra de dados na mídia, uma espécie de competição para saber em que governo se demarcou mais, se foi o Collor, o Fernando Henrique ou o presidente Lula. As demarcações foram importantes porque outorgaram aos índios um espaço adequado para preserv ação da sua cultura, do seu etnodesenvolvimento.


Agora precisa mudar. Por quê?

A reserva isolada, sem atividade econômica, gera dependência. Nesse tipo de situação, a relação com os não-índios torna-se mais permissiva do que quando os índios têm domínio sobre suas propriedades e o seu destino. Congelar o desenvolvimento e manter a tutela é a morte da cultura indígena. O novo Estatuto dos Povos Indígenas (que está no Congresso para ser votado) traz autonomia cidadã aos povos indígenas com responsabilidade social e a possibilidade da autossustentação econômica.

Quem resiste a essa política de mais autonomia econômica para os índios?

Alguns antropólogos têm a visão de que os índios devem continuar isolados dentro de sua cultura, de que o homem branco precisa ficar distante e só acompanhando e garantindo o sustento básico das aldeias. Mas quando a gente conversa com os índios, não é essa a visão que eles têm.

Qual é a visão deles?

Um índio me disse, textualmente, numa reunião: ´´Não queremos que nossa reserva seja um jardim zoológico. Somos seres humanos e não queremos ficar sendo observados.´´ Os índios são parte ativa do Brasil moderno, não do Brasil antigo. É preciso preservar essa cultura diferente para que ela se mantenha de maneira íntegra, mas integrada. O Estado tem de criar condições para que os índios conduzam seus destinos. No Brasil do século 21 é incompatível índios viverem isolados em suas reservas. Eles querem um projeto que não desmate a floresta, não acabe com a pesca, mas, ao mesmo tempo, não querem mais ficar dependentes de cesta básica. Querem algo que lhes dê uma vida melhor.

Que condições os índios impõem, por exemplo, na questão da exploração mineral em suas reservas?


Eles querem o direito à preferência na exploração. Montar uma cooperativa, po r exemplo. Querem também o poder de veto. Para explorar minérios numa área indígena é assim: primeiro os índios têm que autorizar. Segundo: autorizando, eles têm preferência nessa exploração.

Chegou ao fim a era das demarcações de terras indígenas?

Estamos terminando esse ciclo. Mais de 95% do que havia que ser demarcado, já foi. Temos hoje menos de 5% de áreas por demarcar. É preciso concluir esse processo e passar para uma efetiva política de etnodesenvolvimento. Ou seja, temos de começar a trabalhar com a autossustentação das comunidades. Ver o que elas podem fazer para não depender só de recursos da Funai, só do Estado, só de ONGs ou de quem quer que seja. Como elas podem ter um processo de exploração turística, ecológica, o quer que seja, nas suas áreas. Projetos econômicos para que elas possam ter mais dignidade no seu dia a dia. Do contrário, daqui a pouco os índios vão sair das terras, vão para as grandes cidades engrossar bolsões de miséria. Esses índios vão vender a madeira da reserva, permitir o acesso indevido às terras e se descaracterizar social e culturalmente.

Há no horizonte, então, alguma demarcação relevante nesta fase final?


A última grande demarcação do País, pelo seu significado político, foi a Raposa Serra do Sol (RR). Temos agora uma determinação do presidente Lula para dar especial atenção aos índios guaranis, no Mato Grosso do Sul. Estão espremidos em pequenas faixas de terra entre fazendas, em áreas de difícil desenvolvimento de produção. Para esses casos, vamos partir para um programa de aquisição de terras. Ou seja, formação de reserva indígena não necessariamente à base de demarcação de um território nacional.

Como isso será possível?



Seria importante aprovar uma emenda constitucional (PEC n.º 3/04), que tramita no Congresso, para resolver legalmente a s ituação. Vai permitir indenizar a terra integralmente, e não só as benfeitorias nela realizadas. Os 5% que restam para demarcar são áreas conflituosas, no Sul e Sudeste, diferentes das do Norte, onde tinha o grileiro, que não era dono da terra. Você chegava à área tradicional indígena, demarcava e retirava os grileiros. No Sul, muita gente tem o título de propriedade, outorgado na época da colonização, dado pelo Estado, gente que está lá há 80 anos, que recebeu o título do Estado. Tem assentados do Incra. Essas pessoas têm um título de boa fé. Parece razoável que se faça a indenização também pelo valor da terra, para que elas possam reconstruir sua vida fora daquele local.

Em que pé está a tramitação dessa emenda constitucional?


Já foi aprovada na CCJ do Senado e está pronta para ser votada no plenário, com apoio do governo e dos setores envolvidos na questão. Ela permitirá uma saída justa para os fazendeiros. D o contrário, retirá-los vai ser complicado. Há colonos que só saem mortos das suas terras. Queremos um processo de paz.

Uma das mazelas da tutela é o chamado índio chapa-branca, de crachá. Isso também acaba?

A tutela gerou muitas vezes uma relação perversa entre o órgão indigenista brasileiro (Funai) e as comunidades indígenas. Postos foram ocupados por índios, de olho na pequena gratificação (DAS) outorgada. Muitas vezes, outras etnias ficavam indispostas em relação a isso, reivindicavam o mesmo e isso acabava gerando problemas políticos e de execução orçamentária.

Os índios da Raposa Serra do Sol estão satisfeitos?


Há satisfação total pelo fato de as terras estarem asseguradas. Mas eles têm reivindicações, com relação a educação, saúde indígena e geração de renda. Querem energia e a inclusão da reserva no programa Luz Para Todos, para terem acesso a freezers e atividades produtivas qu e a eletricidade propicia.


Qual é, hoje, o problema que mais preocupa o governo na questão indígena?

Na última reunião da Comissão Nacional de Política Indigenista, a grande questão levantada foi com relação à saúde. Outra questão é relacionada à educação: querem escolas e professores especializados em educação indígena. Alguns pediram uma política mais clara de compensação de danos no caso das hidrelétricas.

O que o sr. chama de proteção ideológica com olhos fechados?

É absorver conceitos como este: na terra indígena ninguém pode mexer, ninguém pode entrar. Como se as terras indígenas fossem todas iguais. As terras do Mato Grosso são diferentes da Bahia, Pernambuco, Rio Grande do Sul, ou Amazonas. Há casos em que a reserva indígena efetivamente deve ser preservada, como as comunidades isoladas. Mas não dá para aplicar uma lógica universal.

Fonte: O Estado de S. Paulo